segunda-feira, 31 de março de 2008

Quando uma coisa é para dar errado...

Uma desgraça nunca vem sozinha. Por menor que seja, sempre virá acompanhada. Certo? Quem nunca ouviu a frase “se alguma coisa der errado, ela vai dar errado e da pior maneira possível” ? Ou ainda, “entre dois acontecimentos prováveis, sempre acontece um improvável”? Não é brincadeira, nem pessimismo. São apenas variações da chamada Lei de Murphy. E o pior é que ela se confirma.

Há mais ou menos um mês, pude assinar embaixo do que o engenheiro Edward A. Murphy escreveu. Certa manhã, acordei com dor de cabeça. Como sofro de enxaqueca (e quem a tem sabe exatamente o quão prejudicial pode ser), resolvi tomar um remedinho para evitar futuras inomodações. Contudo, esqueci. Não me importei pelo fato de sempre carregar um na bolsa. "Tomo quando chegar no trabalho", pensei. Todavia, não deu tempo. Fui direto me arrumar, faria uma reportagem em um asilo e precisava me apressar. Como meus objetos pessoais ficam em um armário chaveado – já que andar com bolsas e pastas é um tanto quanto desconfortável - saí sem o remédio. E foi a partir deste momento que a lei de Murphy começou a vigorar.

A dor foi aumentando e minha cabeça latejava. O dia estava quente e não pudia tirar o taillieur, já que a reportagem era filmada. As horas se arrastavam. Meu alívio foi avistar o carro que nos levaria de volta à PUCRS. E que alívio.

Durante as férias, voltava de ônibus em virtude do horário de verão. Mas naquele dia, não agüentei. Deixei de lado a tal independência juvenil - aquela que a gente quer mostrar que tem quando ainda mora debaixo do mesmo teto dos pais - e joguei-me nos braços da comodidade, neste caso, necessária. E como foi bem vinda.

Enquanto aguardava pelo remédio que salvaria o dia, já podia sentir o aconconchego de minha cama e o sossego do meu quarto.

Foi quando avistei. Lá vinha ele, o fuca da família. A relíquia que sai da garagem quando o carro está no conserto. Ele estacionou, eu entrei. E deitei. Caí no banco como se fosse o colchão sob o qual me acomodo todas as noites. Fechei os olhos.

De repente, ele parou. Apagou. Sim, em plena Ipiranga, no fim da tarde, o carro simplesmente morreu. “Deu pros cocos” como diriam os mais velhos. E agora?

Estávamos de quatro . Minha avó acelerava e nada acontecia. Os carros buzinavam. A cabeça formigava. Ainda estava quente. E agora? “Vamos ter que empurrar” sugeriu minha mãe. Minha irmã discordou. Fiquei quieta, talvez estivesse processando a informação. Esperei alguns minutos e concordei, fazer o quê? Se esta é a maneira mais rápida de chegar em casa, vamos lá. Convenci minha irmã - às vezes é possível - e fomos. A esta altura a dor já tinha se espalhado por todo o corpo, até porque, tive que rir da situação. Melhor que chorar. Empurramos até saírmos do meio da rua. E, no caminho, um ser abençoado resolveu nos ajudar, talvez tenha ficado com pena daquelas desengonçadas empurrando. Minhas pernas balançavam. Lataria pesa.

Depois um bom tempo, a salvação. Meu avô, um carro, meu travesseiro. Nunca a casa foi tão bem-vinda... que dia comprido. E que leizinha, hein?

Queira Murphy constatar outros fatos, quem sabe mais positivos... Enquanto isso, torça para que o pão caia com a geléia para cima, para que se você conseguir driblar uma coisa que poderia dar errado de 4 maneiras diferentes, uma quinta não apareça e, claro: Sorria! Amanhã pode ser pior.

sexta-feira, 21 de março de 2008

Comemoração conjunta

2008, um ano incomum. Sim, este ano é especial. Não por ser o último bissexto da década de 2000. Nem pelo outono que promete escassez de chuvas. A novidade, que o fará ser lembrado na história, é a Páscoa. Ou melhor, a data em que ela é celebrada.

O dia em que é lembrada a ressurreição de Jesus Cristo não é escolhido por acaso. A Páscoa cristã é comemorada no primeiro domingo após a lua cheia do outono -no hemisfério sul - ou da primavera - no hemisfério norte. Isso porque é contada segundo o calendário judaico que, por sua vez, é baseado nas fases da Lua. Complicado?

Acontece que, este ano, a Páscoa (do latim Pessach) será festejada muito antes se comparada ao usual (de 22 de março a 25 de abril). A última vez em que ocorreu de forma antecipada foi no ano de 1913.

Coincidentemente, a celebração cristã veio ao encontro de outra comemoração: o possível aniversário do profeta Maomé, expoente da religião islâmica. Mais um motivo para ser lembrada.

Isso quer dizer que estão todos felizes? Antes fosse...

Do lado cristão, a Páscoa é um momento de reflexão. Mas parece que o que mais se reflete são os preços das lembranças, o peixe mais barato, o recorde no varejo. Alguns ainda aproveitam os dias para fazer o que nunca fazem ou adiantar tarefas já que não precisam comparecer ao trabalho. O tal sentido é esquecido e cede o lugar à correria dos tempos modernos.

Do lado islâmico, a data serviu para o reaparecimento de uma das figuras mais temidas na atualidade. Osama Bin Laden aproveitou a comemoração para fazer um “pedido” à União Européia. Na gravação publicada em um site islâmico, o líder da Al- Qaeda pede que as autoridades tomem uma forte atitude quanto a divulgação das charges que envolvem o profeta Maomé. O fato é discutido desde 2005.

E assim como veio cedo, a Páscoa também não tarda a ir embora. Segunda feira, tudo começa outra vez. Descansados, retoma-se a vida. As tarefas voltam a ocupar a cabeça (se não estiveram presentes durante os dias de folga) e as atividades voltam ao normal. Da reflexão pouco fica, quando muito, dura até mais alguns meses. Talvez a maior repercussão seja mesmo a aparição do líder islâmico, afinal, esta se estende por um bom tempo.

domingo, 2 de março de 2008

Razão de ser

Disseram-me que ele tinha voz de anjo. Não sei, nunca ouvi um para poder comparar. Mas que era divina, ah, disso não tenho dúvidas.

O auditório estava lotado. Atenção máxima aos poucos minutos que ficariam eternizados na lembrança. Antes mesmo que ele aparecesse, já era possível sentir o timbre inigualável e os agudos inconfundíveis. Sim, era ele, Milton Nascimento, em Porto Alegre.

Acompanhado pelo grupo Jobim Trio, Milton reviveu a Bossa Nova e os sucessos de sua carreira. Mesmo sentada na galeria da esquerda – o que implica uma visão lateral e leves fisgadas nas costas – o show foi bom e pagaria para ver de novo. Não há ritmo que faça a alma querer tanto dançar e que remexa tanto o corpo sem querer. Samba, Bossa, Milton.

Ao chegar em casa, ainda com as canções ressoando na cabeça, uma sensação de saciedade tomou conta de mim. Algo diferente de quando ligo o rádio para ouvir o que toca, um efeito distinto das músicas que, na atualidade, conhecemos por sucesso.

Muitos dos que estavam lá eram mais velhos que eu e talvez para eles o show tenha tido um significado a mais, pois ao som de melodias como “Coração de Estudante” talvez fosse possível recordar uma juventude que ia às ruas protestar, uma mocidade que sabia o que queria.

Hoje não é mais comum o engajamento estudantil, a junção de pessoas que pensam além, que têm sonhos semelhantes e que querem vê-los realizados. Parece que é tudo muito fácil ou tão difícil que nada é possível. Ou é preguiça ou desesperança. A vida tornou-se uma regra, uma rota que impede seguir por outra direção, pois quem assim o fizer, pode perder vez. E para muitos, isso significa ficar para trás.

As composições de tempos passados diziam mais. São poemas ritmizados, denúncias fantasiadas, desejos alcançáveis. Daí a sensação de saciedade, pois é disso que carecem as vidas sem razão.

Mas antes de qualquer comício, protesto ou passeata, é preciso observar, conversar, pensar. E se começar for difícil, então será o verdadeiro coração do estudante, que cuida da vida, toma conta da amizade, que tem “alegria e muito sonho espalhados no caminho, verdes, plantas, sentimento, folha, coração, juventude e fé”.